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Automutilação na adolescência


Nos últimos meses atendi adolescentes que relataram, entre outras queixas, a prática da automutilação. E por perceber que a prática vem crescendo (principalmente entre os adolescentes), e muitas vezes os responsáveis não sabem como agir, decidi escrever este mês sobre o assunto.


Para quem ainda tem dúvida, automutilação (ou cutting) é o ato de se machucar intencionalmente, de forma superficial, moderada ou profunda, sem intenção suicida consciente. São atos lesivos contra o próprio corpo, como cortes, perfurações, mordidas, beliscões e espancamentos, feitos a mão ou com o uso de objetos, alegando-se a intenção de aliviar tensões ou outros sentimentos egodistônicos.

Como disse acima, a grosso modo, a automutilação é usada como um escape para aliviar a tensão, como um “analgésico” para dor emocional; e não tem como objetivo chamar a atenção, como muitos pensam. Aliás, em sua maioria, as pessoas que sofrem desse transtorno tentam esconder as suas marcas e sentem vergonha, medo e culpa de terem se automutilado… Por isso é fundamental frisar que essas pessoas precisam de ajuda e não de críticas!


Trabalhos acadêmicos recentes mostram que a prática da automutilação acontece em diferentes faixas etárias, porém se revela mais frequente entre adolescentes, sobretudo do gênero feminino. Esses trabalhos, ao analisarem o conteúdo das manifestações em espaços virtuais, encontraram correlação dos hábitos de automutilação com as frustrações relativas ao universo das descobertas dos adolescentes: envolvendo uso de drogas, bullying, isolamento social, crises familiares, as primeiras decepções amorosas, baixa autoestima, transtorno alimentar, depressão, ansiedade, fobias, ou até mesmo fuga. É importante lembrar que não existe um padrão para as causas. Cada indivíduo desenvolve por um motivo diferente.


Você deve estar se perguntando: “O que fazer se eu perceber que uma pessoa querida está praticando o cutting?” Primeiramente, como escrevi no parágrafo anterior, essas pessoas não precisam de críticas, e sim de AJUDA! Ofereça apoio, conforto e compreensão. Se você for professor(a) desse adolescente, acolha efetivamente este aluno, demonstre que está disponível para escuta e que pode compreender seus problemas. Converse primeiro com o aluno, mostrando que sua palavra tem valor. Essa conversa também deve servir para verificar se existe algum conflito familiar ou uma situação de bullying, caso haja bullying, uma ação que envolva toda a turma pode ser promovida.


Se você for responsável por este adolescente e não sabe como agir, sugiro abrir espaço para o diálogo e consequentemente a confiança surgirá. Demonstre respeito pelo que o adolescente diz, não use contra ele o que ele confessar. Paciência é fundamental para “trabalhar” as informações que eles trazem. A regra é: eduque com leveza, suavidade e bons exemplos.


E se você for amigo, além do apoio e compreensão, converse e oriente o adolescente e a família buscar ajuda profissional para o tratamento.


O tratamento deve ser feito de forma interdisciplinar. É importante o cuidado médico, uma vez que determinados cortes podem exigir intervenção cirúrgica ou medicamentosa, mas também necessita de acompanhamento psiquiátrico e psicológico. A psicoterapia é essencial porque é o espaço em que o adolescente é autorizado a falar das suas dores físicas, emocionais e da sua angústia. É onde ele será acolhido na sua individualidade, com toda sua subjetividade. Espera-se que através das palavras que inicialmente surgirão cortadas, posteriormente se farão inteiras e quem sabe, poderá advir daí o real alívio para o “corte da dor”.


Ah! Enquanto escrevia este texto, descobri um projeto muito bacana para ajudar os automutiladores: o PROJETO BORBOLETA. Este projeto foi criado por praticantes da automutilação que sentiam a necessidade em parar, e consideravam-se prontos para enfrentar o desafio. A ideia é relativamente simples, e pode ser mais um aliado na luta contra a prática de automutilação, já que a ideia é fazer com que a pessoa treine/desenvolva seu autocontrole.


As regras são:

1) Quando você sente que quer cortar ou se ferir, com uma caneta ou marcador, desenhe uma borboleta em seu braço ou mão (ou em qualquer outra parte do corpo onde você quer infligir dor/autoferir);

2) Nomeie a borboleta com o nome de um ente querido ou alguém que realmente quer que você obtenha melhora;

3) Você deve deixar a borboleta desaparecer naturalmente. Não esfregue a parte desenhada, ou aplique produtos que possam remover o desenho;

4) Se você cortar a parte do corpo onde há a borboleta, medite que você a matou. Se você não cortar, ela continua viva e livre! (lembre-se que esta borboleta representa alguém importante para você);

5) Se você tiver mais de uma borboleta, e se cortar (ou machucar de alguma forma) você matou a todas elas;

6) Outra pessoa pode desenhá-las em você. Estas borboletas são “extra especiais”. Cuide bem delas!

7) Se em algum momento você perder o controle, e se cortar, não desista. Recomece todo o programa.

8) Mesmo se você não se corte, sinta-se livre para desenhar uma borboleta para mostrar seu apoio a uma pessoa que pratica o cutting. Se você fizer isso, e nomeá-la, estará ajudando-a(o) a treinar o autocontrole.

Um grande abraço e até mês que vem, Thays.


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